Privatização da Sabesp é equivocada e elevará tarifas, avaliam especialistas

Companhia de capital aberto e 49,7% de ações negociadas no mercado, é gerida com princípios de eficiência de uma empresa privada; governo do Estado, acionista principal, recebe anualmente até R$ 500 milhões do lucro

A privatização da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), uma das prioridades do governador Tarcísio de Freitas (PL) durante seu mandato, é um grande equívoco. Os argumentos do político de que a venda da empresa ao setor privado reduziria as tarifas, melhoraria a eficiência dos serviços, além de cumprir a meta de universalização prevista no novo marco regulatório, não se sustentam.

O cenário previsto é o oposto ao imaginado pelo governo paulista, na avaliação de um grupo de técnicos e líderes do setor: André Lucirton Costa, engenheiro de produção, professor titular da FEA-RP/USP, de Ribeirão Preto, Hugo de Oliveira, economista, consultor do Banco Mundial e ex-presidente da Arsesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo); João Jorge Costa, engenheiro, ex-diretor de Operações na Sabesp e José Everaldo Vanzo, engenheiro civil e sanitarista, ex-diretor de Operações e de Engenharia da Sabesp.

Eles lembram que a Sabesp é gerida com os mesmos princípios de eficiência e lucratividade de uma empresa privada, é uma companhia de capital aberto com 49,7% de ações negociadas no mercado e distribui 25% do lucro líquido aos acionistas. O governo do Estado, acionista principal, recebe anualmente entre R$ 300 milhões e R$ 500 milhões do lucro da companhia e municípios paulistas que mantiveram ações da Sabesp também recebem dividendos.

A companhia adota o regime de contratação via CLT para seus quase 12 mil empregados que atendem 30 milhões de habitantes no Estado. “A Sabesp é referência internacional em governança corporativa e gestão executiva na prestação de serviços de água e esgoto, atendendo os princípios de sustentabilidade econômico-financeira estabelecidos pelas Bolsas de São Paulo e Nova York”, explica o ex-presidente da Arsesp, Hugo de Oliveira.

A Sabesp se sustenta e realiza investimentos sem o aporte de recursos públicos e destina 75% do seu lucro líquido para investimentos futuros. Por ano, a companhia investe R$ 5 bilhões, o que representa 50% de todo o aporte realizado no setor no Brasil entre empresas públicas e privadas de saneamento.

Para os especialistas, a Sabesp tem padrões de eficiência que a tornam um benchmark do setor. A companhia já comprovou junto à Arsesp a capacidade financeira de alcançar a universalização dos serviços dentro dos prazos estabelecidos pelo novo marco do saneamento. Menos de 10% das cidades que a Sabesp atende ainda não alcançaram a universalização dos serviços de esgotamento, mas todas as 369 cidades nas quais tem a concessão estão universalizadas com os serviços de abastecimento de água.

Tarifas mais altas e concessões desastrosas
Além disso, lembram os técnicos, a política tarifária da companhia se baseia no princípio do subsídio cruzado, para beneficiar usuários de baixa renda, mas sem onerar o Estado. As tarifas sociais têm descontos que variam de acordo com a vulnerabilidade das comunidades atendidas. Os valores pagos pelos clientes da Sabesp nas suas várias categorias correspondem, por exemplo, a 40% dos praticados pelos operadores privados que venceram a licitação da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae).

“Diante destes fatos parece óbvio que vender o controle acionário da Sabesp é uma decisão extremamente prejudicial à maioria da população e à despoluição das águas. O Estado de São Paulo, além de seu patrimônio, perderá o controle da execução operacional eficiente e aderente aos princípios públicos para a área do saneamento”, lamenta o engenheiro sanitarista e ex-diretor da Sabesp José Everaldo Vanzo, que ocupou cargos de direção em empresa privada de saneamento e trabalha no setor desde 1977.

Como aconteceu com vários setores, inclusive o de saneamento, há um alto risco de a Sabesp ser assumida por uma empresa privada, provavelmente pertencente a um grupo financeiro estrangeiro, não aderente a esses princípios públicos. Experiências nacionais e internacionais mostram vários exemplos de concessões e PPPs desastrosas.

No Brasil o caso mais latente é o de Manaus (AM). A concessão privada vigora desde 2000, atende apenas 16% da população da capital amazonense com redes coletoras e tratamento de esgotos e com tarifas médias 70% maiores do que as da Sabesp. No exterior, a Thames Waters, privatizada em 1989 na Inglaterra, acumula dívidas de US$ 17,5 bilhões e mostra os impactos negativos que uma gestão privada pode produzir.

“Diante de tudo, é fato que, ao abdicar do controle acionário da Sabesp, as tarifas aumentarão, investimentos serão reduzidos e a universalização dos serviços não será alcançada em 2033. O mais sensato seria incentivar o setor privado a investir no saneamento de cidades paulistas que ainda não alcançaram sua universalização e em projetos relativos aos resíduos sólidos e à drenagem”, completa André Lucirton Costa, ex-diretor e professor titular da FEA-RP/USP

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