NEM TODA CONSTRUÇÃO NO BRASIL É PRECÁRIA — E EU POSSO PROVAR

Por Bárbara Kemp, arquiteta e especialista em projeto e gestão de obras
Dezembro, 2025 – Sim, temos um problema estrutural na construção civil brasileira — e ele não é novo. Mas, ao contrário do que muitos pensam, esse problema não nasce apenas da falta de conhecimento técnico ou da comparação com outros países. Ele começa antes, na forma como planejamos, conduzimos e fiscalizamos nossas obras. O improviso, o desprezo ao processo e a ausência de gestão ainda marcam boa parte do setor — e isso, sim, deveria nos envergonhar.
Trabalho há mais de 30 anos com gerenciamento de obras simultâneas em todo o Brasil. Já estive em canteiros de grandes capitais e em cidades onde a primeira pergunta ainda é: “cadê o mestre?”. Nesse tempo, aprendi que qualidade não é uma questão de sorte — é método. E método exige governança, processos padronizados, escuta ativa, indicadores de desempenho e, sobretudo, respeito ao cliente e à equipe. Quando isso não existe, o que sobra é dor de cabeça, estouro de orçamento e paredes rachadas.
Em muitos países, há uma cultura consolidada de que o projeto é a alma da obra — e é tratado como tal. Lá, o tempo dedicado à etapa de planejamento costuma ser maior do que o da execução. Isso não é um atraso, é uma estratégia para garantir obras mais rápidas, seguras e sem surpresas. Aqui no Brasil, infelizmente, ocorre o oposto: projeto é visto como papel, custo ou risco, e não como o principal instrumento para evitar improvisos e adicionais. Essa inversão de valores custa caro — especialmente em obras públicas ou reformas mal-conduzidas, nas quais até mesmo o levantamento cadastral, tão essencial, é negligenciado.
A crítica à baixa qualidade da construção é legítima. O que não podemos é reduzi-la a experiências individuais — ainda que emblemáticas — ou tratar o setor como uma massa homogênea de erros. Há quem esteja fazendo diferente. Há empresas sérias, equipes comprometidas e soluções inovadoras que já mostram caminhos possíveis para virar esse jogo.
Vejo isso diariamente com os projetos que coordenamos: obras entregues no prazo, dentro do orçamento, com planejamento prévio e gestão integrada de todas as etapas. Desenvolvemos uma plataforma própria com mais de 30 ferramentas para garantir visibilidade total do processo, controlar riscos, reduzir retrabalho e rastrear cada insumo, cada fornecedor, cada prazo. Essa visão sistêmica já nos permitiu, por exemplo, executar mais de 3.000 pontos de troca de marca em 11 meses e transformar 435 agências bancárias em 10 meses — sem caos, sem improviso e com muita planilha na veia.
Isso não significa que acertamos sempre. Significa que temos método para errar menos. E mais: que temos responsabilidade com quem paga a conta — seja o cliente, o morador ou o usuário final. Afinal, não estamos falando de levantar paredes. Estamos falando de construir confiança.
Por isso, o debate sobre a construção civil precisa evoluir. Em vez de apontar o dedo para esse ou aquele, que tal olharmos para o topo da cadeia? A maioria das falhas em obras começa com decisões mal tomadas na largada: projetos mal detalhados, cronogramas irreais, orçamentos subestimados. É ali, antes do primeiro tijolo, que moram os principais riscos.
O Brasil tem desafios urgentes no setor: um déficit habitacional superior a 7 milhões de moradias, um gargalo de infraestrutura que ultrapassa R$ 200 bilhões por ano e um volume de resíduos da construção civil que chegou a 44 milhões de toneladas em 2023. Mas também temos uma oportunidade única de transformar esse cenário com tecnologia, planejamento e gestão.
Não se trata de negar os problemas. Trata-se de encará-los com pragmatismo, responsabilidade e compromisso com a excelência. Sustentabilidade, qualidade e eficiência não são bônus — são obrigação.
Porque quando uma obra dá errado, não é só um teto que desaba. É a confiança de quem acreditou naquele projeto.
Entendemos que o olhar crítico é importante, mas também é fundamental mostrar que existem soluções, métodos e profissionais comprometidos com uma construção civil melhor no Brasil.
Bárbara Kemp é arquiteta, especialista em projeto e gestão de obras, e cofundadora da Kemp Projetos, empresa nacional com foco em planejamento, eficiência e transformação digital na construção civil. Lidera projetos simultâneos em todo o país e atua pela profissionalização do setor com foco em pessoas, dados e processos.

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